21 de julho de 2011

Mitos sobre a Agricultura Biológica, Parte I




A agricultura biológica é apenas a velha agricultura tradicional com um novo nome. É um retrocesso tecnológico e é defendida por quem receia a modernidade.

A agricultura biológica é diferente da agricultura tradicional feita pelos nossos avós. É uma agricultura moderna, nascida no século XX, em paralelo com a agricultura convencional ou industrial.
É verdade que faz uso de antigos métodos da agricultura tradicional, como a compostagem da matéria orgânica e o uso de adubos verdes, mas porque estes métodos foram extensamente estudados e validados cientificamente. Por outro lado, a agricultura biológica apoia e aplica técnicas inovadoras como a mobilização mínima do solo, as armadilhas com feromonas, insectos estéreis e estirpes de bactérias para combater pragas, preparados à base de extractos de plantas e minerais para combater doenças, máquinas agrícolas com baixo impacto ambiental, etc.

Igualar a agricultura biológica a uma recusa da modernidade e da evolução tecnológica é um perfeito disparate, pois ela é extremamente moderna e em muitos casos está na linha da frente no que diz respeito à evolução científica e tecnológica.

O que leva certas pessoas a acusarem a agricultura biológica de recear a tecnologia, é o facto da agricultura biológica não abraçar indiscriminadamente todas as novas tecnologias como o faz a agricultura convencional. A tecnologia no seu conjunto não é boa nem má, mas cada tipo de tecnologia em particular tem um certo número de vantagens e desvantagens, que devem ser tidas em consideração na sua avaliação. A agricultura biológica tem critérios que lhe permitem distinguir quais as tecnologias que servem os seus objectivos sem pôr em causa os seus princípios e por isso é selectiva quanto àquelas que adopta, optando por aquelas que se propõem a trabalhar em harmonia com a natureza e de acordo com as suas regras, ou que causem o mínimo de perturbação ou dano à natureza. A agricultura biológica apenas recusa as tecnologias que procuram dominar a natureza em vez de serem seus parceiros, pois estas destroem os equilíbrios dinâmicos da natureza e a médio e longo prazo não são sustentáveis.


Os agricultores biológicos não têm como combater as pragas e doenças e por isso ficam de braços cruzados quando as culturas são atacadas, perdendo grande parte das suas culturas.

É verdade que ainda existem muitas lacunas no conhecimento da protecção de certas culturas, que por vezes tornam difícil o combate a certas doenças e pragas só com recurso a métodos de luta biológicos. No entanto, isto também se verifica na agricultura convencional.
A agricultura biológica tem um vasto manancial de técnicas de prevenção e de tratamento, que permitem que as perdas por doenças e pragas não sejam muito diferentes das da agricultura convencional. Além disso, a agricultura biológica não está parada no tempo, está em permanente desenvolvimento e evolução, tal como a agricultura convencional. Por isso, tal como surgem todos os dias novos pesticidas para a agricultura convencional, também todos os dias surgem novos avanços científicos nos métodos biológicos de protecção das culturas. Infelizmente, o investimento por parte de estados e empresas na investigação dos métodos biológicos é muito pequeno quando comparado com o investimento na investigação de produtos químicos para a agricultura convencional, pelo que é normal que existam menos conhecimentos sobre protecção de culturas no campo da agricultura biológica. Se houver maior investimento, muito mais poderá ser descoberto e desenvolvido.

Como não usa pesticidas, os produtos da agricultura biológica estão contaminados por bactérias e fungos perigosos para a saúde humana.
De vez em quando surgem alertas de que os produtos biológicos poderão ser perigosos para a saúde humana. Os produtos biológicos já foram “acusados” de possuírem níveis elevados de nitratos, de metais pesados, de bactérias patogénicas e de micotoxinas (toxinas produzidas por fungos). No entanto, os estudos são inconclusivos, porque se uns apontam para uma maior concentração destes factores nos produtos biológicos, outros não encontram diferenças relativamente aos produtos convencionais e outros apontam precisamente para o contrário, que os produtos convencionais possuem esses factores perigosos em níveis mais elevados.
Até que a situação seja definitivamente clarificada, resta usar o nosso bom-senso.
Por exemplo, relativamente às micotoxinas: os detractores da agricultura biológica teorizam que por esta não usar fungicidas, propicia o desenvolvimento de fungos tóxicos nas culturas; já os seus defensores teorizam que, pelo facto da agricultura biológica fazer rotação de culturas e outras medidas que actuam preventivamente no aparecimento destas doenças, estas não chegam sequer a ser um problema como o são na agricultura convencional.
Relativamente às bactérias: os detractores da agricultura biológica teorizam que os produtos biológicos estão mais sujeitos à contaminação, por não receberem tratamentos químicos que as destruam e por se utilizarem estrumes na adubação das culturas; por outro lado, os seus defensores argumentam que os estrumes são compostados por vários meses, antes de serem aplicados nas culturas, processo que destrói as bactérias patogénicas e que o facto de não se usarem produtos químicos, garante o equilíbrio ecológico dos microrganismos, não permitindo a proliferação dos microrganismos patogénicos para o ser humano.
Contra-argumentação e raciocínios semelhantes podem ser feitos relativamente às outras questões levantadas.
Considerando ainda que os produtos industrializados:
- possuem cada vez menor riqueza nutricional e menor teor de factores protectores contra doenças, enfraquecendo-nos o organismo (ao contrário dos biológicos, que comprovadamente têm maior capacidade de proteger a nossa saúde);
- estão contaminados por pesticidas, hormonas, antibióticos e doenças graves transmissíveis ao homem (considerando também a pecuária), que estão entre os factores responsáveis pelo aumento exponencial de cancros e outras enfermidades mortais no ser humano (e que nenhum destes produtos tóxicos é usado na agricultura e pecuária biológicas);
- produzem grande poluição ambiental que acaba sempre por nos afectar, através do ar e da água que entra no nosso organismo (ao contrário da agricultura biológica, que contribui para uma melhoria significativa do meio ambiente).

Porque será que os defensores dos alimentos convencionais industrializados os classificam como seguros e acusam os produtos biológicos de serem uma ameaça mortal? Parece óbvio que esses alertas não são motivados por genuína preocupação com a saúde dos consumidores, mas por outro tipo de interesses.




Bibliografia
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“A Revolução da Agricultura Verde – a Agricultura Biológica em Portugal e no Mundo” in Ozono – Revista de Ecologia, Sociedade e Conservação da Natureza, Número 1, Outubro de 2000, págs 40-43